quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Quando o sofrimento é tão visível...

A jovem não estava bem. Mas, não queria falar, sobre o que lhe ia na alma, e eu respeitava o seu silêncio, o baixar da cabeça sempre que lhe falava, as hesitações no diálogo...
- O que tens?
- Não tenho nada - respondia, invariavelmente.
Por que sofreria daquela maneira? Parecia ausente, a anos luz do sítio onde estava, como se uma força superior a encaminhasse para dentro de si e lhe fechasse todas as portas.
Estaria enamorada? Podia ser uma paixão de adolescente, por algum colega da escola ou outro rapaz. 
Era muito bonita, com uns olhos salientes e um olhar penetrante, de uma beleza que a mim me parecia não ser igual à das outras meninas, aliás, todas são mais ou menos distintas; nunca tinha estado em sítio, onde com tão pouca gente, trinta ou quarenta, a diversidade étnica fosse tão evidente.
Um dia perguntei-lhe:
- Tens irmãos?
- Não tenho da parte da mãe, morreram. Só tenho da parte do pai.
Não fiz qualquer comentário. Passadas semanas, quando a relação comigo era maior, disse-me:
- Já não tenho mãe, a minha mãe morreu. 
Baixou a cabeça. O silêncio tornou-se ensurdecedor. Por que me tinha falado apenas dos irmãos? Talvez, porque só perguntei por eles. Ou, talvez, pela impossibilidade de falar da morte da mãe, tal era o sofrimento. 
Pensamos que tudo é banal, que tudo é passageiro; mas percebi, e cada vez com maior clareza, que assim não é. 
Por mais que o mal aconteça a todos e se generalize, deixa marcas e muitas. Virá esta jovem a ter apoio psicológico que visivelmente precisa? Não sei, temo que não, estamos tão longe das sociedades organizadas que conhecemos na Europa que falar num sistema de saúde em Moçambique é uma quimera. 





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